Um pequeno e típico talho Lisboeta serve de ponto de partida para a obra “Domínio Zero”. A montra deste caricato açougue era algo que quase me assombrava diariamente, quando lá passava de autocarro a caminho da faculdade. Finalmente, numa ainda quente noite de Outubro, consegui captar devidamente a invulgar montra do talho, que em tanto se distinguia das restantes da mesma rua.
A razão do meu registo prende-se, acima de tudo, com a atracção do próprio local - com as suas cores, com a plasticidade dos alimentos, pelo modo peculiar como estão organizadas (diria até empalhadas) as carnes, por toda a sua ambiência grotesca. Não consigo deixar de apontar para a leve ironia encontrada numa montra com alimentos dispostos e oferecidos de uma forma tão agressiva, fazendo com que os alimentos, eles próprios, ganhem uma dimensão quase monstruosa e anormal, tão longe do seu propósito final - seduzir a fome e o gosto de quem por ali passa.